29 de março de 2011

you ain't got no behaviour!



Don't know who could be your saviour!

25 de março de 2011

What i got...

Get Out!

Bom senso

DiGratixxxx!


Steel Pulse muvucado? Sim, eu vou.

Confira a programação completa: http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/893881-veja-a-programacao-completa-da-virada-cultural-2011.shtml

24 de março de 2011

Pra essa gente careta e covarde!

Agora eu vou cantar pros miseráveis
Que vagam pelo mundo derrotados
Pra essas sementes mal plantadas
Que já nascem com cara de abortadas
Pras pessoas de alma bem pequena
Remoendo pequenos problemas
Querendo sempre aquilo que não têm
Pra quem vê a luz
Mas não ilumina suas minicertezas
Vive contando dinheiro
E não muda quando é lua cheia
Pra quem não sabe amar
Fica esperando
Alguém que caiba no seu sonho
Como varizes que vão aumentando
Como insetos em volta da lâmpada
Vamos pedir piedade
Senhor, piedade
Pra essa gente careta e covarde
Vamos pedir piedade
Senhor, piedade
Lhes dê grandeza e um pouco de coragem
Quero cantar só para as pessoas fracas
Que tão no mundo e perderam a viagem
Quero cantar o blues
Com o pastor e o bumbo na praça
Vamos pedir piedade
Pois há um incêndio sob a chuva rala
Somos iguais em desgraça
Vamos cantar o blues da piedade
Vamos pedir piedade
Senhor, piedade
Pra essa gente careta e covarde
Vamos pedir piedade
Senhor, piedade
Lhes dê grandeza e um pouco de coragem

23 de março de 2011

Oi?

Consistência e profundidade.
Ter ou não ter?
Eis a questão.

22 de março de 2011

Sente o peso da marreta...

O contador de histórias, dessa vez, apresenta o video clipe de um realismo sensível e extraordinário, um tanto incomum na cena do rap. A faixa escolhida para o trabalho é a música Por que Meu Deus? que fará parte do primeiro álbum solo do mc, intitulado Crônicas da Cidade Cinza, um dos mais aguardados pelo público.
Ogi nos presenteia com uma pedrada sonora de arrepiar e emocionar.
A letra conta do inconformismo, da igualdade, da desigualdade, da injustiça, de uma realidade nada crua requentada no bafo da vida de cada um; da escolha dos caminhos que não necessariamente são guiados pelo bem ou pelo mal, mas simplesmente pela existência real dos opostos separados: cada qual em sua casa.
O beat marcado e suingado é asinado pelo próprio mc.
Eu convido agora todos os leitores que passeiam por este blog a conhecer e ouvir o mais novo clássico do rap nacional.
Com vocês, Ogi.

20 de março de 2011

Mulatu Astatke



Arrepie, chorei, emocionei, impressionei, ei... ei... ei... Mulatu é nosso Rei!
Foda demais e teve ainda Talib Kweli dando uma palhinha! Ráááááááá!
Showzasso! Amanhã tem mais, quem puder vá, não vão se arrepender!
http://www.sescsp.org.br/sesc/programa_new/mostra_detalhe.cfm?programacao_id=190144

18 de março de 2011

José Manuel



José Manuel era um homem que não tinha do que reclamar. Sua vida era boa, trabalhava como carteiro, cantava na churrascaria Boi de Prata aos sábados e aos domingos fazia bico no Lava - rápido do seu Tião. Conseguia pagar as contas sem aperto e gostava mesmo das coisas simples da vida. Sua alegria era levar a mulher para sambar na Água Rasa na sexta-feira.

Casado com Esmeralda há 10 anos, José Manuel fazia questão de estar sempre ao lado de sua dama, uma mulata bonita de olhos verdes, forte, sensível, de origem humilde e sem papas na língua. Esmeralda trabalhava em casa, vendia marmitex e cuidava dos afazeres domésticos. Como não tinham filhos, viviam em lua-de-mel. Esmeralda sabia satisfazer seu homem, nunca ouviu sequer uma reclamação sobre seu amor e seus carinhos, ele era a tampa e ela a panela.

Dia desses no samba da Água Fria, Esmeralda dançava e se balançava para o seu amado José, ela rodava e sorria com vontade, chamava a atenção de todos ao redor, seu corpo exuberante e olhos tentadores deixavam qualquer um de boca aberta.
José não tinha ciúmes, gostava de exibir a mulher, ficava feliz em ser o "dono" daquele templo, mas ela não, ela era ciumenta e não podia ver sirigaita nenhuma de tititi com seu homem. O sonho de Memê era ser dançarina profissional, ela já tinha tentado concursos, promoções e até desfiles, mas sempre ficava em segundo lugar, ela odiava o segundo lugar, mas ali ela era única, e parecia ser a número um.

Entre goles e tragos, José foi ao banheiro, no caminho foi parado por Michelly, uma loira bunduda em ponto de ebulição, louquinha para dar o bote no cangote de José. Delicadamente ele a afastou e apontou em direção a sua dama, disse que não era homem disso, era casado, fiel e amava sua mulher. Continuou seguindo até o banheiro. Demorou alguns minutos para sair, não pensava na ousadia de Michelly, tudo o que ele queria era sambar com sua eterna Memê.
José lavou as mãos e tentou voltar à roda, não conseguiu, Michelly estava na porta do banheiro espreitando a sua janta. Como uma leoa faminta empurrou José para dentro do banheiro, trancou a porta e foi direta:
- Larga essa nega e vem comigo, vou fazer você chegar ao céu e fazer valer o meu apelido "boquinha de mel". Grudo forte e faço até o Brad Pitt largar a tal da Angelina. Você nunca conheceu ninguém como eu, garanto que não vai se arrepender.

José Manuel finalmente reparou em Michelly, não pôde deixar de se excitar com sua silhueta, sua bunda avantajada e seu cabelo loiro, era bonita, mas não chegava aos pés de sua Memê, ele respondeu que não era capaz de uma coisa dessas, que nunca traíra sua mulher antes, não tinha vontade e ele tinha que voltar a roda.

Michelly o agarrou, cheirou o seu pescoço, deu uma lambida em sua orelha e sussurrou em seu ouvido:
- Você acabou de perder a maior chance de sua vida, seja feliz comendo arroz e feijão todo dia, o filé aqui vai saborear outras bocas famintas.
E saiu.

José respirou fundo, lavou o rosto, os pulsos, arrumou a braguilha, ficou confuso, mas finalmente saiu do banheiro.

O samba rolava e sua Memê já não mais sambava, sentada com seu chope indagou José:
- Ô home, onde foi que você se meteu? Tô até agora esperando pra sambar e nada de você aparecer. Não pense que eu não vi aquela jararaca falando com você no corredor.
- Ela veio me perguntar se você era passista de escola de samba, pois disse que nunca tinha visto uma mulata tão bonita sambando como você.
- Duvido.
- É sério! Disse que nunca viu um casal tão bonito e apaixonado.
- Acho bom essa sem vergonha vir falar isso pra mim, se eu descubro que ela tava tentando qualquer coisa e que você está mentindo, eu acabo com você.
- Calma morzinho. Não aconteceu nada.
- Acho bom mesmo!
-Vem nega, vamos sambar que a noite nem começou ainda.
E assim, eles continuaram. Felizes e dançando.

O sábado chegou e José Manuel foi se apresentar no Boi de Prata, Esmeralda nunca ia no mesmo horário, ela entregava as quentinhas até às duas da tarde, depois se aprumava para a churrascaria. Memê adorava ver José tocar e cantar, era uma alegria poder estar com ele mesmo em seu local de trabalho.
José arrumou seu banquinho, ajeitou a alça do violão e começou a cantar: "O homem que diz dou, não dá, porque quem dá mesmo, não diz, o homem que diz vou, não vai, porque quando foi já não quis, o homem que diz sou não é, porque quem é mesmo é não sou o homem que diz to, não ta, porque ninguém tá quando quer. Coitado do homem que cai no Canto de Ossanha, traidor, coitado do homem que vai atrás de mandinga de amor..."

O público apreciava a canção e entre as mesas e picanhas, José avistou o filé Michelly. Sozinha, sentada, com vestido decotado, batom vermelho e um copo de caipirinha. Michelly engodou José e continuou ali.
Entre uma pausa, foi falar com ela:
- Veja bem, eu sou casado, não tenho intenção nenhuma com a senhora, minha mulher viu a gente conversando e veio investigar. Eu disse que você tinha elogiado a dança dela, ela duvidou, mas depois conseguimos nos divertir e esquecer o que tinha ocorrido.
Michelly deu um gole em sua caipirinha, respirou fundo e disse:
- Em primeiro lugar, porque você mentiu para sua mulher? Se você não quer nada comigo não tem motivos para temer. Em segundo lugar, eu jamais elogiaria aquela nega dançando nem aqui nem na Sapucaí e em terceiro lugar, porque é que você está falando comigo? Vim atrás de carne vermelha, não de frango.

José, se espantou, realmente não tinha motivos para mentir. Não disse nada, saiu e voltou para o seu banquinho. Agora ele começava com "Judia de mim, judia. Se eu não sou merecedor desse amor..."

Fez outra pausa e foi até o banheiro se lavar, seu pensamento agora era de Michelly, ficava louco só de pensar naquela loira se insinuando na sua frente, não conseguia disfarçar a alegria e a agonia de vê-la mais uma vez.
Lavou as mãos e sentou-se para esperar Memê, procurou um lugar distante de Michelly para que não houvesse problema. Esmeralda chegou, caminhou em direção a José Manuel, deu-lhe um beijo e sentou-se.
Eles pediram a comida, José estava ansioso, nervoso e Esmeralda notou a agitação do marido.
- O que foi Zé? Aconteceu alguma coisa amor? Você tá suando, o que foi?
- Nada minha Memê, to com calor e quero logo ir pra casa com você.
- Calma nego, logo nós estaremos lá.
Enquanto eles comiam, José tentava disfarçar seu nervosismo, de repente ele começou a ficar branco, pálido, e chegou a engasgar com a carne. Esmeralda tentou ajudá-lo quando foi interrompida por um esbarrão em seu braço. Quando virou-se deu de cara com a sirigaita da noite anterior. Michelly se desculpou e pasmou:
- Ah! Você é a dançarina da Água Fria, você dança muito bem. Parabéns.
Esmeralda, ficou sem jeito, agradeceu e por educação convidou-a para sentar.
Michelly não hesitou, puxou a cadeira ao lado e sentou na mesma hora.
- Meu marido me contou sobre você.
- É mesmo? Ele disse o quanto eu achei bonito ver você dançando?
- Disse sim, fiquei na dúvida, né? Hoje em dia não existe mulher assim, as mulheres perderam o respeito, são tudo um bando de sem vergonha, se atiram em cima de qualquer um, se estiver em um palco então, nossa aí elas ficam mais assanhadas ainda. Não tenho paciência pra vagabunda.
- Calma, amor, não precisa usar esse palavreado, assim você assusta a convidada.
- Assusto nada, to errada ou não mulher? Como é que você se chama?
- Michelly. E eu concordo com você. Hoje em dia as mulheres estão muito oferecidas, é só ver aliança no dedo de homem que sai por aí se oferecendo.
- Aí, ta vendo Zé. Ela é das minhas.
- É, to vendo.

O papo continuou, Zé voltou a cantar, e elas continuaram a prosear.
José encerrou a apresentação, se despediu de Michelly e notou quando ela colocou um papel em seu bolso, mas ignorou e seguiu com Memê como se nada tivesse acontecido.

Eles voltaram para casa, conversando, José Manuel respirava aliviado que nada tinha dado errado, se soltou e começou a fazer planos com Memê, elogiou sua postura na churrascaria e continuaram subindo em direção a viela que moravam.
Esmeralda chaveou a porta, sentou no sofá e pediu para que Zé sentasse com ela.
- Zé, você sabe que eu sou educada e que eu não gosto de barraco não sabe?
- Sei sim, amor. Por quê?
- Você acha mesmo que eu caí na ladainha daquela piranha? Aquilo ali é cobra criada, se aproxima da vítima pra depois dar o bote.
- Mas do que você esta falando?
- Não se faça de desentendido, querendo pular a cerca depois de velho? Você acha que eu sou o que? Burra? Você não sabe do que eu sou capaz, você não sabe da raiva que eu to sentindo. Te arranco os pêlo do saco com a unha, mordo sua bunda e te jogo no latão ladeira abaixo.
- Que horror, Memê. Você acha que eu seria capaz de te trair com uma sirigaita daquelas?
- Não me interessa. Só de pensar em matar já matou. Comigo não cola, ou é ou não é.
- Mas, Memê, eu te amo, nunca pensei em ninguém a não ser você meu amor.
- Não venha me chatear, seu frango seco. Te mordo e te mato com os dente. Eu sou mulher, você acha mesmo que eu sou como você que de Zé Mané tem até o nome?
- Memê, aquela moça só foi educada em te elogiar, ela nunca quis ou tentou nada comigo, acredite em mim.
Esmeralda estava vermelha de raiva, não conseguia acreditar naquela lorota barata, sabia que aquela besta humana não sabia mentir, andando de um lado para o outro ela bufava e gritava:
- Tem gato nesse telhado, eu sei que tem. Tem caroço nesse angu, e vai dar zebra nesse jogo. Mulher não se engana nunca, José eu te mato, te mato. Fala logo a verdade José, não sou mulher de acreditar em história da carochinha. Fala home, de uma vez por todas.
- Tá bem, eu falo.
Esmeralda sentou-se no sofá, a sala estava escura, ela suava e respirava ofegante.
- Eu sabia. Pode começar seu cachorro nojento, filho de uma vaca leiteira, você é um safado cara de pau. Você achou mesmo que eu ia cair naquela de que eu sou passista e sambo bem? Achou mesmo? Pode começar fi. Só saio daqui com esse cavaco esclarecido.
- Memê meu amor, eu seria incapaz de magoar você. Meu coração pertence a você e eu não vejo outra mulher na minha frente, só você. Sou doidinho por você, pelo seu cheiro, pelo seus cabelo liso, seus olhos verdes são como duas pedras preciosas que me guiam na escuridão, não sou nada sem você, minha nega. O que realmente aconteceu foi o seguinte, eu conheci ela na sexta mesmo, no samba. Ela me parou e disse que você podia ganhar muito dinheiro sambando. Eu ri, afinal quem ganha dinheiro sambando? Ela me explicou que era cantora e que precisava de uma dançarina para fazer parte de seus shows. Eu disse que seria maravilhoso, mas que não contaria até o negócio estar certo. Eu sabia que você ficaria ansiosa e que talvez desistisse com medo do segundo lugar. E hoje, ela foi lá para me confirmar tudo. Disse-me que você está contratada e que será a número um da banda S de samba. Amor, você não vê? Nós fizemos uma surpresa para você! Queremos que você seja a melhor! A número 1 em todos os lugares!

- José Manuel, com esse papo de "queremos" você acha mesmo que eu acredito nessa conversa fiada? Você está me irritando e tá se enrolando cada vez mais.
- Zé, eu te pego na curva, te arranco um bendão da sua bunda, arranco sua unha com faca e ascendo um rojão na sua orelha, destruo a sua laia e ainda te ferro na saída. Zé, você não me conhece, Zé. Você tá brincando com fogo.
- Memê, você acha que eu seria louco de brincar com uma coisa dessas? Nunca meu amor. Eu quero ver você maior, quero ver você mostrando que tem samba no pé e que é a melhor de todas. Você sabe que esse grupo é famoso, você vai ver, vai se tornar a melhor passista do Brasil.
Esmeralda, ficou calada, começou a respirar e pensar com mais calma. A vermelhidão de seu rosto começou a desaparecer e José Manuel perguntou:
- E então, amor? Acredita em mim?
- Acredito. Como vai ser agora?
- Fiquei de ligar para confirmar sua participação na banda, vou ligar para essa
Michely e vou dizer que você topa fazer parte do grupo. Quando eu tiver alguma posição eu te aviso, meu amor. Viu só que maridão?! Sou seu fã numero zero e tudo o que eu quero é te ver feliz.

Esmeralda o abraçou e pela primeira conseguiu visualizar o seu sonho se realizando.
Naquela noite, eles foram dormir mais cedo, os dois estavam muito ansiosos,
Esmeralda por dar o maior passo da sua vida e José Manuel por ter mentido e pior agora ele estava com a corda no pescoço, como encontrar essa banda? Como convencer de que sua mulher é a melhor e que tem muito a oferecer pelo grupo? José estava perdido e neste momento nem Michelly importava mais. Era preciso fazer valer a sua palavra. O sono não veio e tudo o que ele fez foi suar, roer as unhas e pensar. Pensou em tudo e não via saída para o problema que tinha acabado de inventar.
O galo cantou e Esmeralda acordou. Era domingo e ela sabia que José faria o bico no Tião, cruzou com ele no banheiro, já pronto para o trabalho, deu um beijo de bom dia e abriu a porta para o marido.
- Mais tarde eu volto e trarei ótimas notícias.
Esmeralda suspirou, confirmou com a cabeça e foi fazer o café.

José andava apressado, precisava avisar Tião de que hoje ele não poderia trabalhar, chegou mais cedo e disse que tinha um problema pessoal para resolver. Tião disse que precisava dele, o dia estava quente e teria muito serviço. José Manuel, foi mais específico, disse que precisava resolver um caso de vida ou morte, enlace ou desquite e Tião então liberou José para sua peleja.
José pegou o telefone, apanhou umas fichas e fez a ligação para Michelly.
- Alô, Michelly? Sou eu José Manuel, preciso te encontrar agora.
- Ah, eu sabia que você não resistiria. Onde você está?
- Estou na Rua nove com a avenida do Bosque, como faço pra ir aí?
- Pegue o bonde das oito em direção a Rua do Val. Moro na casa 13.
- Estou a caminho.
- Hum... e eu estou esperando.

José pegou o bonde, e seguiu. Desceu na rua do Val e tocou a campainha da casa 13.
Michelly atendeu a porta, e o puxou pelo colarinho. José Manuel saltou para dentro da casa e anunciou o seu desespero:
- Olha, eu peciso de ajuda, eu menti, menti pra minha Esmeralda, disse que você cantava no S de Samba e que estava contratando passistas para fazer parte do grupo, não consegui falar a verdade, fiquei pensando no seu fogo e fiquei louco, não queria me entregar.
- Eu sabia que você não resistiria aos meus dotes, não há Esmeralda no mundo que fique impune.
- Você não está entendendo? Eu estou perdido! Preciso encontrar algum modo de fazer a coisa acontecer, disse que você tinha gostado dela e que ela estava contratada, preciso voltar para casa com notícias.
- E o que você quer que eu faça? Continue com essa sua mentirinha? Pra quê?
- Mas eu fiz isso por nós, tudo começou naquele maldito banheiro, você não tinha nada que me procurar e me complicar.
- Já ouviu aquele ditado "malandro demais se atrapalha?" Então meu caro Zé... A vida é mesmo uma escola. Vá, volte pra sua Esmeralda, você acabou de apagar a única faísca que existia do meu fogo.
- Mas, Michelly, como eu vou fazer? O que eu posso fazer?
- Tudo que posso dizer é que o S ensaia todo domingo na quadra do Arco.
- Na quadra do Arco??? Mas isso fica do outro lado da cidade!!!
- Então corra, vá até lá e veja se consiga alguma coisa, procure pelo Beto e diga que eu mandei lembranças. É isso ou sua pedra preciosa vai descobrir que belo marido ela tem.
- Não, isso não. Tenho que ir.

No final das contas Michelly perdeu o encanto por José, esse jeito desesperado tinha acabado com tudo, ficar ou não com ele não fazia a menor diferença.

José saiu correndo da casa 13 e começou a correr. Pegou o bonde das nove horas, e seguiu sentido ao centro, a viagem era longa, sentou-se e começou a pensar no que diria para o tal Beto. Sua cabeça doía, não pregara o olho a noite toda, o corpo estava moído e parecia que o bonde seguia a 10 por hora. José pegou no sono e acordou com uma sirene, a sirene gritava e atordoava José. Como um alarme, despertou e olhou pela janela para ver o que estava acontecendo. Um caminhão tinha tombado no trilho do bonde e aquilo levaria horas para ser resolvido. José saltou do bonde e resolveu seguir a pé. Caminhou durante duas horas, chegou ao centro da cidade e pôde ouvir o ronco de seu estômago. Já era hora do almoço e ele não tinha mais energia para continuar. Entrou num botequim, sentou pediu um ensopado de peixe com batatas e arroz, comeu e se sentiu cansado, mas logo recobrou a consciência e lembrou de sua Memê. Pagou a conta e seguiu para a estação de trem, comprou o bilhete e esperou o trem das duas. Agora faltava pouco, ele estava cada vez mais perto do seu destino e depois de tanto, não pensou em desistir. A viagem durou uma hora e meia, o trem parou no seu destino e ele desceu buscando informações para chegar na quadra do Arco. Um senhor o ajudou e explicou que era pertinho dali:

- Em cinco minutos você está lá. Hoje tem ensaio do S, se puder passe por lá. É o melhor do Brasil e o pessoal aqui do Arco tem orgulho de dizer que tudo começou aqui.
- Mas é pra lá mesmo que estou indo. Preciso falar com um tal de Beto, o senhor conhece?
- Beto? Mas é claro que sim, o Beto é o meu sobrinho mais velho.
- Jura?
- Claro! Porque você acha que eu mentiria? Só porque ele tem fama de mau?
- Não, er... Eu nem o conheço e não sei da sua fama. É que eu estou com um problema, e parece que só ele pode me ajudar.
- É mesmo? Então conte-me e eu o levo até lá. Me chamo Ulisses, e você?
- Muito prazer, seu Ulisses, me chamo José Manuel.

Os dois caminharam em direção a quadra do Arco, José explicou a sua história e Ulisses pacientemente ouviu e sem julgar disse que falaria com Beto antes, para evitar qualquer problema. José Manuel agradeceu muito e lhe deu um abraço. Ulisses retribuiu e disse que entendia de mulher, era macaco velho e entendia o desespero do rapaz. Pensou: nem molhou o bico e já todo lascado.
Ulisses entrou na quadra do Arco e pediu para que José esperasse ali. Ele obedeceu e ficou observando a conversa dos dois. Beto parecia um armário, era forte, grandalhão e recebia paparicos das mulheres que estavam ali. José esperou cerca de cinco minutos, Ulisses o chamou e ele foi em direção aos dois.

- Então você é o a camarada que está com a corda no pescoço?
- Sim, sou eu. Olhe eu fiz isso porque fiquei maluco, fui tentado por uma mulher sedutora, não resisti e não consegui contar para a minha mulher que ela estava interessada em mim. O nome dela é Michelly, ela disse que te conhecia e disse para eu te procurar.
- Boquinha de mel? Ela continua grudando firme?
- É, eu não sei. Não conheci esse lado dela.
- Você conheceu que lado então? Você nem sequer consumou o fato?
- Não, senhor, eu sou... bem... Eu era um homem de respeito, só tinha olhos para minha Esmeralda, até que Michelly aparecer e bagunçou tudo.
- Sei como é, ninguém é de ferro, mas vamos ao que interessa. Meu tio me disse que sua mulher sonha em ser passista e que nesse seu rolo todo você colocou toda a rapaziada do S na reta, é isso?
- É. Não foi por mal, eu não sabia o que fazer e só isso alegraria minha Memê.
- Tudo bem, não precisa se explicar. Como ela é?
- Ah, ela é linda, uma mulata arretada de olhos verdes, com um belo par de pernas e um corpo escultural. Memê é linda e tem um samba no pé como nenhuma outra.
- Olha José Manuel, não me leve a mal, mas essas passistas aqui são as melhores da cidade, tem que ser muito boa mesmo para sambar no S.
- Isso não vai ser problema, Beto. Garanto que você não vai se arrepender.
- Tá certo. Vou te ajudar, mas é bom ela ser boa mesmo, se não acabou.
- Fechado. Quando posso trazer ela aqui?
- Peça pra ela vir aqui na quarta-feira, vamos fazer um teste com ela. Quarta-feira às sete horas. Não vá desperdiçar essa chance, e tente não se meter em confusão, principalmente com Michelly.
- E a Michelly? Digo o que para minha Memê? Eu disse que ela era cantora.
- Diga que Michelly partiu. Que teve que ir viajar e que você não sabe quando ela volta.
- Boa, vou dizer isso mesmo. Muito obrigado Beto, não sei como te agradecer.
- Não se meta mais em confusão, e agradeça meu tio Ulisses, fiz isso por ele.
- Obrigado seu Ulisses, muito obrigado, vou recompensar o senhor.
- Não precisa rapaz, aprenda a lição e não erre mais. Agora vá, volte para Memê e conte as boas novas.
- Está bem, mais uma vez muito obrigado. Preciso ir, senão perco o trem. Até quarta.

José chegou em casa exausto, mas estava feliz. Já passava das nove horas e ele abriu a porta como quem abre um pote de ouro.

- Memê, Memê, cadê você?
- Tô aqui, Zé. O que foi homem? E porque você demorou tanto? Você não tava se enroscado com aquela loira aguada né?
- Não, Memê, lógico que não. Eu dei uma ripa no Lava-rápido, depois fui tratar da sua contratação no S de Samba.
- E aí meu amor? O que deu? Tudo certo?
- Tudo certo, graças a Deus. Quarta-feira a gente vai à quadra do Arco para você mostrar o que é que a Esmeralda tem.

Memê pulou no colo de José e o beijou loucamente, aquele momento pareceu durar uma eternidade. José estava cansado e só queria saber de dormir. Esmeralda estranhou, seu marido nunca havia negado fogo antes, mas a felicidade era tanta que ela nem deu trela. Deitou ao lado do marido e sonhou com a sua entrada na quadra do Arco.

Os dias se passaram e Memê era só alegria, José Manuel estava calmo, porém aflito, tinha receio de não cumprir com a sua palavra. A agonia acabou quando Esmeralda escutou o primeiro batuque do tantan e o pandeiro batendo forte. Foi apresentada para Beto que ficou encantado com a beleza e o samba de Memê. Naquele dia, Esmeralda sambou como ninguém e fez jus a palavra de seu José Manuel. Esmeralda parou a quadra do Arco, as passistas ficaram loucas de ciúmes, Beto só tinha olhos para ela. Quando o som acabou, Beto foi conversar com o casal.
- Esmeralda você será a nossa passista número 1. Você será a rainha do S de Samba. Você acha que encara?
- Se encaro? Venho sambar todo dia se for preciso.
- Ótimo. Teremos show no sábado e será importante ter você nos ensaios.
- Amanhã mesmo eu estou aqui.
Beto beijou a mão de Esmeralda e se despediu de José, ao apertar sua mão, ele disse:
- Você tinha razão, Esmeralda nasceu para ser rainha.
- É, eu disse.

Os dois foram embora, José pela primeira vez na vida ficou enciumado com Memê, sentiu o gosto amargo de não dar valor pra sua mulher e ficou calado até chegar em casa.
Os dias se passaram e Memê chegava tarde por causa dos ensaios. José se sentia feliz pela mulher, mas já não sabia se era isso que ele queria. Ele era feliz e não sabia, sentia falta dos jantares juntos, das quentinhas que levava pro trabalho, sentia falta de Memê acordar cedo para dar bom dia, ela chegava tarde e dormia mais do que nunca José se mordeu de raiva, tudo aquilo estava acontecendo por causa dele. Se ele não tivesse se metido com Michelly, se ele tivesse se segurado, ele não teria que mentir e eles continuariam felizes. Mas como saber? Era Deus ou José Manuel? Quem tinha escrito esse destino?

José saiu da churrascaria e foi correndo até o bairro das Laranjas, o show ia começar e ele não podia perder a estréia de sua Memê.
José sentou na mesa do fundo, a casa estava cheia, o público só tinha olhos para Esmeralda que foi apresentada como a nova Rainha do grupo S de Samba. A cada rebolada, os homens ficavam loucos, Beto sempre muito atencioso, fazia pausas para não cansar Memê, que retribuía o carinho e se entregava aos encantos do reinado. Em alguns momentos José perdia Beto e Esmeralda de vista, mas quando menos percebia lá estavam eles, sambando e encantando o público. O samba tocou por três horas e finalmente chegou ao fim. José correu em direção a Memê para parabenizá-la e dar um abraço. Ela era sucesso e graças a Beto ele continuava sendo um homem digno. Mesmo com raiva, José Manuel tinha muito a agradecer. Estranhou a frieza de Memê, mas ignorou, achou que fosse o cansaço. Quando de repente Memê dispara:

- Não posso mais, Zé. Não posso mais fingir. Estou apaixonada por Beto, e é com ele que quero ficar. Agora sou a número 1 e não condiz eu ficar com o número 2 do samba.
José engoliu seco.
- Como assim o número 2? Memê sou eu! O seu Zé, o seu nego. Como você pode fazer isso comigo.

E numa frieza dura e cruel Memê foi fatídica:

- Não te amo mais. Vou viver o meu sonho e brilhar na avenida. Aqui é o meu lugar.

José tentou, bem que tentou, argumentou, esperneou, chorou e por fim calou.
A imagem da sua Memê abraçada com Beto, fez com que ele sentisse que esse era o merecido final. Não restava nada a ser feito, a não ser aceitar. Ele havia mentido, traiu a sua Esmeralda, em pensamento, mas traiu e foi salvo por Beto para que continuasse íntegro. Veja a peça que o destino o pregou. O preço pago foi mais caro do que ele imaginava, não tinha Memê, nem ao menos Michelly, nem mesmo um bom e velho samba para se consolar. Até o samba morreu na vida de José Manuel. O eterno Zé Mané.

16 de março de 2011

11 de março de 2011

Há...

Quando não há mais inspiração
Quando tudo que você tem não existe mais
Quando as pessoas parecem não te compreender
Quando você achar que chegou ao fim
Quando não existir mais forças
Quando a música para de tocar
Quando a voz não cantar mais
Quando toda a revolta calar
Quando o ar ficar rarefeito
Levante, tudo novamente se repete. E sempre.

No matter what

All that's left is a band of gold

3 de março de 2011

Nel mezzo del camim...

Cheguei. Chegaste. Vinhas fatigada
E triste, e triste e fatigado eu vinha.
Tinhas a alma de sonhos povoada,
E alma de sonhos povoada eu tinha...

E paramos de súbito na estrada
Da vida: longos anos, presa à minha
A tua mão, a vista deslumbrada
Tive da luz que teu olhar continha.

Hoje segues de novo... Na partida
Nem o pranto os teus olhos umedece,
Nem te comove a dor da despedida.

E eu, solitário, volto a face, e tremo,
Vendo o teu vulto que desaparece
Na extrema curva do caminho extremo.


Olavo Bilac

1 de março de 2011

O Que Foi Feito Deverá...

O que foi feito, amigo, de tudo que a gente sonhou
O que foi feito da vida, o que foi feito do amor
Quisera encontrar aquele verso menino
Que escrevi há tantos anos atrás

Falo assim sem saudade, falo assim por saber
Se muito vale o já feito, mais vale o que será
Mas vale o que será
E o que foi feito é preciso conhecer para melhor prosseguir

Falo assim sem tristeza, falo por acreditar
Que é cobrando o que fomos que nós iremos crescer
Nós iremos crescer, outros outubros virão
Outras manhãs, plenas de sol e de luz